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Quão estranhas são as maneiras como descrevíamos o mundo; com que rapidez congelamos o passado em sua mera ideia, um desenho animado deste ou daquele ano ou década distante. Estou escrevendo um livro sobre a cantora Kate Bush, e outro sobre minha formação, projetos que exigem muitas folheadas em revistas dos anos 1980. Na revista mensal The Face, de estilo londrino, encontro uma reportagem de capa sobre “Electro: a batida que não será vencida”. É maio de 1984, a primeira onda do hip-hop já passou e este verão pertence à bateria eletrônica Roland e aos sons importados dos clubes de Nova York. Fiz 15 anos naquele mês e me lembro muito bem dessa cúspide musical. O que me surpreende agora nas páginas do The Face: há apenas ínfimos indícios da greve dos mineiros britânicos e do aumento do desemprego que está convulsionando politicamente o país. E nem uma única menção ainda à AIDS; em um anúncio do Wrangler, o balão de fala de uma modelo anuncia, alheio: “Sou positivo”. Nas páginas desta revista, é e não é o 1984 da minha memória.
“Eles nos pareciam destroços inestimáveis naquela época”, escreveu certa vez Elizabeth Hardwick, lembrando-se de seu fascínio juvenil por velhos discos de jazz. Há muito tempo sinto o mesmo em relação às revistas, velhas e novas. Como adolescente em Dublin na década de 1980, dependia de revistas (principalmente britânicas) para me manter informado e realizar meus sonhos sobre música, moda, arte, literatura – e as maneiras de escrever sobre elas. Outros da minha idade podem saber de cor as músicas que ouviram e os poemas que leram na adolescência, mas eu me lembro dos layouts de página: onde certas frases ficavam em algum ensaio ou crítica aparentemente urgente, a coreografia da imagem, legenda e assinatura. Meu romance com a página da revista ainda se emociona dentro de mim, de modo que, quando a pesquisa me leva off-line para bibliotecas e arquivos, ou (melhor) para as profundezas de uma descoberta empoeirada do eBay, não consigo parar nas páginas da revista ou do diário que estava procurando por; Quero ler tudo, do mastro aos classificados.
Revistas antigas são máquinas do tempo baratas, arqueologias do desejo coletivo. Encontre uma edição impressa, especializada ou popular, de preferência com mais de 20 anos (embora 10 possam resolver o problema) e leia-a de capa a capa. Você não executará nenhum mergulho profundo, não desaparecerá em nenhum buraco de coelho; sua leitura é, em vez disso, uma fatia lateral de uma cultura, classe ou ambiente. Há alguns anos, enquanto escrevia um livro sobre grandes frases, fui procurar legendas de fotos que Joan Didion compôs nos anos 1960 durante sua passagem pela Vogue. Encontrei esses fragmentos perfeitamente formados e sem créditos, mas também Didion escrevendo sobre um novo museu na Cidade do México – “A pessoa sai lembrando de certas pequenas coisas, assombradas por esquisitices” – e outras peças de alto tom: Hardwick revisando filmes, artigos sobre Alberto Giacometti e Gunter Grass. Havia fotografias de moda de Gordon Parks e William Klein. Confirmei o que suspeitava sobre a sofisticação estética das revistas americanas de meados do século e seus leitores.
Revistas antigas são máquinas do tempo baratas, arqueologias do desejo coletivo.
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